
PANDEMIA AUMENTOU O RISCO DE TER UMA DOENÇA MENTAL
Quinta, 17 de Fevereiro de 2022 - 09:37
Neide Urbano, médica pedopsiquiatra no Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central - Hospital Dona Estefânia (Clínica da Juventude), revela os sinais de alerta para a depressão e os efeitos da pandemia na saúde mental dos adolescentes.
H - Estudos apontam que os sintomas de depressão duplicaram neste período. Nota este cenário na prática clínica?
Neide Urbano (N.U.) - A pandemia e os confinamentos trouxeram vários fatores de stress adicionais aos adolescentes. O maior impacto sente-se nos adolescentes que, previamente, já tinham uma perturbação psiquiátrica (cerca de 20%), e nos que têm maior vulnerabilidade para desenvolver uma perturbação psiquiátrica. Assim, e neste período, estes adolescentes ficaram mais vulneráveis a desenvolver uma doença mental sendo que na maioria dos casos, houve agravamento da sintomatologia pré-existente, nomeadamente de sintomatologia depressiva e ansiosa.
H - Este agravamento reflete-se em novos casos ou em doentes já diagnosticados?
N.U. - Reflete-se em ambos os casos. No entanto, são os adolescentes com perturbações psiquiátricas prévias que têm maior risco. Em causa, a dificuldade em aceder aos cuidados de saúde mental, mas também a suspensão de acompanhamentos na fase inicial da pandemia, mudança de registo de consulta presencial para à distância, ansiedade relacionada com a covid-19 e, principalmente, pela dificuldade em lidar com o confinamento. Com a generalidade da atividade clínica dos cuidados de saúde primários alocada à covid-19, verificou-se uma redução do apoio ao nível da prevenção, rastreio e acompanhamento de situações menos graves. Ao nível dos cuidados de saúde primários, não tem sido fácil para as equipas de Psicologia e pelos médicos assistentes prestarem este apoio. O que se traduz em que nos cheguem casos com uma sintomatologia mais grave ou encaminhados diretamente pelo Serviço de Urgência, com situações mais avançada da sintomatologia psiquiátrica. Houve, também, um aumento de pedidos de consulta, que levou a um grande aumento do tempo de espera para primeira consulta.
H - Alguns estudos apontam para um aumento da prevalência no sexo feminino. Confirma o cenário?
N.U. - A perturbação depressiva é mais comum em raparigas do que em rapazes. Como a Covid-19 levou a um aumento das perturbações depressivas, esse aumento verificou-se sobretudo no sexo feminino. Alguns estudos apontam mesmo que esse aumento se deveu ao facto de, durante o confinamento, as raparigas poderem ter estado mais sujeitas a violência intrafamiliar. Em contexto do Serviço de Urgência, o apoio ocorreu junto de raparigas com idade entre os 15 e 16 anos, com diagnóstico de perturbação depressiva e que, em muitos casos, realizaram atos autoagressivos ou com intenção de os realizar.
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